"Lata absoluta"

Dia 29 de maio de 2011 - Espaço Energisa - João Pessoa - PB

Todo processo, seja qual for sua natureza e onde ele estiver acontecendo, faz brotar uma confluência genial (e as vezes nem tão genial) de conflitos que vão, lenta ou rapidamente, se espalhando entre os atores (sujeitos) desse mesmo conflito.  No teatro e na arte quase todo processo de criação deriva de proposições exclusivas do ser que se debruça sobre a possibilidade de gerar arte, independente da vertente buscada. Muitas vezes essas proposições surgem de situações do cotidiano que nos põe à prova, ou de meras imagens sem conexão alguma com o presente ou simplesmente de devaneios que aparentemente não têm sentido algum, porém, de certa forma a proposição surge e algo precisa ser feito com ela. Sendo assim, o sujeito a expõe, transportando-a para o mundo das impressões reais. Não se pode afirmar que esse "parto" se constitua de uma tarefa simples e harmoniosa, afinal iniciar "processos" em vida não são atribuições fáceis dadas aos seres humanos.
Toda criação por si só já dói e é mistério, este porque nunca sabemos onde exatamente ela chegará com sua potencialidade ou fraqueza e aquele pela dedicação e negação que o sujeito se propõe para que ela se mantenha viva dentro de sua interpretação.
Os jogos para a construção da cena são jogos de criação (de processo), na tentativa de entender no corpo, na voz e nos sentidos o que se procura dentro da arte. O sujeito se propõe a essas articulações de dinâmica no intuito de construir o mundo daquela criação específica e, por vezes, se questiona: "onde isso vai dar?" ou " e ai, chegamos?".
Assim se desenrola o pulsante "Lata absoluta" do direitor de teatro, Paulo Vieira, com as atrizes Celly de Freitas e Cecília Retamoza.
Um trabalho que se propõe a enxergar o mundo do cirador-intérprete de maneira objetiva. Duas atrizes inseridas no tortuoso espaço de compreender exatamente para onde seguir em sua criação. Proposições de voz, movimentos, elementos cênicos sendo lançados naquele universo. Jogos de construção de cena que rementem o espectador para o curioso (a não menos doloroso) ponto de vista do sujeito-ator que se depara com o que deve ser criado e, não menos, com a razão para tanto.
Todo agente criador, ao assistir "Lata absoluta" identifica a suada e consistente trança de ideias que as atrizes (atriz 1 e atriz 2, ao meu ver) promovem entre si. Tantos caminhos, tantas propostas, tantas questões envolvem esses dois seres que caminham em busca da "criação" para transportá-la, enfim, a uma outra dimensão, fazendo passá-la das impressões reais em direção ao que há de mais consistente: a eternidade.
Isso me remete à "metáfora" de Gil, quando ele diz: "Uma lata existe para conter algo. Mas quando o poeta diz: 'Lata', pode estar querendo dizer o incontível", por isso o processo de criação artístico é diferente dos outros processos em sua consistência e essência. Em face disso "deixe a meta do poeta, não discuta. Deixe a sua meta fora da disputa. Meta dentro e fora, lata absoluta. Deixe-a simplesmente metáfora".
"Lata absoluta" é a metáfora da criação. A metáfora do processo que não desiste de se colocar diante de todo artista que insiste em criar.

Joyce Barbosa
bailarina